Ano Velho

Pouco mudou,
Muito se discutiu,
Nada se fez,
Para tudo se mentiu,

Momento algum escutou,
Em lugar algum se falou,
Entre todos ninguém viu,
Nada se sentiu,

Mais um dia se passando,
Passa o dia e o ano,
Meia noite da noite,
Chorando de alegria,

Até que passa o tempo,
Vai e vem o vento,
Passa mês e dia,
Sonho e fantasia,
Até o ano novo.

Alusões

Lembro de você como um caminho,
Uma rota sem destino,
Uma rua sem volta,
Um som mudo,
Um dia noturno,

Algo esquecido e lembrado,
Algo calado ao meu lado,
Algo cansado no descaso,
Algo que foi e deixou de ser,

O que poderia ter sido,
O que deveria ter dito,
O que poderia ter visto,
O que seria ter sentido,

Agora, uma barco sem vela,
Agora, um mapa sem rumo,
Agora, um ponteiro apontando,
Agora, aponta o fim de tudo.

Toda a Vida

Essa espera sem tempo, imprevista em todos e esperada desde quando aprendemos a sentir. Esperamos a cada segundo que o mundo mude por completo. Antes caminhavamos de mãos vazias e hoje, alguém as segura e nos olha nos olhos. Contamos com esse momento para viver o dia seguinte. Não há vida sem a esperança de um dia ela ser preenchida de todas as formas. Não são apenas os livros e histórias, as exceções de outras vidas ou as certezas suspiradas numa promessa. Vivemos por que esperamos e essa espera é nossa vida. Nada é certo no amanhã. Caimos alguns dias, nos levantamos e seguimos, lembramos e desviamos e deixamos de cair. Nessa nossa existência, não é possível pensar em sentimentos, mas sim momentos. Não se encontra a total felicidade até ter vivido toda sua totalidade.

Vingança

Como um brilho no escuro que surge uma vez, apenas para dar a ilusão de que nem tudo é breu. Usa da esperança para manter sempre o sentimento do que perdeu. Engana com sorriso rápidos e monossilábicos. Quando nada se espera, uma centelha percorre o céu da noite, dançando entre as estrelas, avisando do fogo que não existe. Se queria vingar momento triste, assim conseguiu. Sem nenhum esforço, feriu. Agora só basta esquecer. A cicatriz não vai mais doer e quando nada ganhar, algo perdeu. Pensamento algum rendeu, e depois, vira história, poeira ao vento da memória. Algo que no fim, não prosperou, o egoísmo não deixou e se vendeu a vingança esperada. Agora não a mais nada, do que uma simples vingança.

Semana

Quero ver o sol nascendo,
Noutro dia de verão,
Passar a semana inteira,
Equilibrado num cordão,

Sentir a noite caindo,
A lua subindo,
Na noite com vento,
Esquecendo e sumindo,

Saber do nascimento,
Do dia do não,
Essa semana inteira,
Esquecendo perdão,

E ver de longe chegando,
Nuvem carregada,
Carrega dentro dela,
A lágrima, a lágrima...

Essa Dança

Sem querer ela me vê,
Em pé, no meio da chuva,
Pensa duas vezes se vai me querer,
Cansado de tanta loucura,

Tudo que quer saber,
Ela procura,
Tudo que ela quer ver,
Ela não me encherga,

Na beira do mar ela caminha,
Com pés de aréia,
Pensando se vai me querer,
A vida inteira,

Tudo que quer sonhar,
Ela consegue,
Tudo que ela quer lembrar,
Ela não me esquece,

No canto da cama ela rodeia,
Com o lençol arrastando o chão,
Pensava que era verdade,
Mas era ilusão,

Tudo que quer ser,
Ela não sabe,
Tudo que ela quer ter,
Ela não deixa,
Tudo que preciso é coragem,
E ela só me deixa.

Nesse Novo Dia

Nem sequer olho para o relógio. Estou fora do tempo e espaço. Sou meu próprio universo girando ao redor do vazio a bilhões de quilómetros por hora. Serei um Deus, criando vida e tirando-a. Farei a luz do amanhecer e o breu da noite. Onipresente dentro de mim, onisciente de cada átomo do meu ser. O criador e punidor do mundo meu. Um horizonte de eventos, criando as incertezas do infinito, sua loucura improvável e a indeterminada razão de ser na improbabilidade da sua existência. Eu como a gravidade e suas leis, a verdade e suas contradições. Incerto como todas as certezas e impossível como todas as possibilidades do "não". Nascerei hoje, por que ontem já se foi. Amanhã é novo dia e hoje sou tudo que existe na fantasia onírica de viver. Assim na Terra como no Céu, serei meu alpha e ômega. Meu nascer, viver e morrer. De mim sairá a razão da existência de cada segundo do meu ser. Nesse meu novo dia.

Sopro

Queria falar tudo,
Que você quisesse ouvir,
Mas nada nesse mundo,
Vai trazer você pra mim,
Não adianta só palavra,
Cantada ou declamada,
Nem a mais linda rosa,
Ou a luz do luar,
Não mando no que quero,
Nem quero mandar,
Mas sofrer de carinho,
Que não posso te dar,
Ou viver sozinho,
Por sem você estar,
Prefiro encontrar outra pessoa,
Para me magoar,
Do que esperar atoa,
Que você venha a mudar.

Não Sou Eu

Não sou eu,
Quem você conheceu,
Era pessoa passada,
Um dia visada,
Que você esqueceu,
Deixou no caminho aquele cara,
Que comigo um dia pareceu,

Não sou eu,
O rapaz com cara magoada,
Lágrima quase chorada,
Segurando lembranças nas mãos,
Esperando esquecer da negação,
Que eu nunca ouvi,

Não sou eu,
Por que ali não mais existe,
O momento, mesmo triste,
Desapareceu,
Aquilo é passado e não volta,
Era um eu, diferente,
Aquele rapaz,
Não sou eu.

Com o Tempo Que Me Falta

Esse tempo passado,
Demorado e esgotado,
Pouco tempo ou tempo algum,
Do que me resta dele,
Não serei só mais um,
Com o restante vou ser diferente,
Terei tempo suficiente,
Dono dele e não mais servo,
Perda de tempo será um inferno,
Paraíso com o tempo virá,
E nada com o tempo mudará,
Será o tempo todo,
Todo o tempo será,
Ganharei tempo vivendo,
Tendo tempo para sonhar,
E nesse intervalo de tempo,
Só o tempo dirá,
Se dei tempo ao tempo,
Quando no fim do tempo,
O tempo acabar.

Lethe

As margens do esquecimento, me alimento do mesmo sentimento. Me sinto faminto com cada diferença, cada passo que não me aguenta. Posso esquecer de tudo a qualquer minuto, mas lembro do que não sei. Essa ignorância aos sentimentos, talvez as lembranças, talvez o relento. Mas posso simplesmente esquecer, se de um copo dessa aguá eu beber, mas não quero mais. Quero lembrar mesmo do nada que me traz. Mesmo apagado, ainda posso ver, como se o mundo não deixasse esquecer. Cego, sem sentir ou falar, posso saber que dessa esperança não vou escapar. Vai estar em meus olhos, na minha fala. É horizonte, nesse céu sem mar. Esqueço do rio que me esquece e vazio fico até chegar, passo pelas margens escuras, caminhando. Esse destino que ainda me guia, não sei para onde. Quando chegar, não quero deixar de lembrar. Cada passo nesse mundo, darei por que no fim, não sei o que terei, mas sonho o que será.

O Barqueiro

Água escura do rio move lentamente para lugar nenhum. Os sons torturados emanam a dor sem vida, tentam me negar jornada. Nada importa a não ser o destino, seja qual for. A barcaça se aproxima, uma mão pede o dízimo da travessia, sem esperar minhas razões. Pago o que devo, mas espero paciência para que ouça explicação. Em vida estava no barco da lamentação. A travessia acompanhada de tristeza e solidão. Na voz murmurada do barqueiro, cântico a Eurídice. Conto então da felicidade, momentos e lugares de amor. De forma lamentosa, ele aponta sem hesitar o rio da dor. Falo das lembranças e palavras, vontades e planos, sorrisos perfeitos. Ele aponta na decida o rio, o caminho procurado para quem quer esquecer. Lamento então o dia negado, do sol apagado e do silêncio. O rosto frio aponta sutil o rio gelado da negação. Cansado, virando o barco, negando minha peregrinação. Conto-lhe da esperança, da incerteza da vida e de toda indecisão. Talvez por só ver a certeza da morte, nunca tenha entendido a canção. Orfeu não parou para explicar que na melodia, nada mais existia a não ser o amor que oferecia, sem ele não era herói, história ou fantasia. Sem o caminho da morte, não poderia entender a vida. Segui caminho pelo rio da melancolia.

Catabasis

Mergulho no abismo incerto em busca da incerteza. Perco a cabeça a cada centímetro sem questionar tal queda. A verdade é aquela que me cerca. Me sujeito a total indiferença, caminhando por labirintos, seguindo destinos marcados por um fio de lã. Na escuridão me encontro tateando cada passo, no meu encalço, o passado e nele existe você. Nesse lugar desesperançado, sozinho, com medo de temer a próxima esquina e não te encontrar. Assim, lembro de Orfeu, que morte nunca temeu e por esses caminhos percorreu, em meio ao desespero dos eternos e das certezas convenientes da eternidade. Chegou o mesmo aos mortos, vivo e esperançoso, tocando melodia divina, pois ali estava em busca do amor. Esqueceu então do tempo e deixou de ser sereno para ali se mostrar inteiro, certo e seguro de que nada existe nesse nem em outro mundo, que se iguale ao seu amor. Diante do sub-mundo, sem argumentos, não carrego peças de prata, mas subo nessa barcaça a caminho.

Então Lembra

Não é importante ver nesse futuro distante uma incerteza constante que domina a vida. Essa saudade é minha, assim como a vontade de estar e querer de qualquer jeito. Palavras que falo por inteiro sempre me deixam reticências. Continuações de pensamentos sem delimitações de começo sem final. Parei no mundo no calçamento, sem arriscar sentimento ou dor. Evito olhar nos seus olhos fixamente. Sem querer me perco novamente, sem guia, cego. Para mim, o sorriso que me alegra, quero ter para sempre ela, se um dia permitido for. Em nada vou julgar esse meu jardim, por pouca flor. Ignorar meus próprios erros, cometidos entre tempos e ventos, rugidos de cor. Sou egoista e quero seu sorriso, aonde estiver, quero levá-lo para onde quer que me leve. Serei então o que tiver de ser, para ter o que me for possível e viver o que me for capaz.

Across Again

Quando foi que decidiu ver que os sonhos que teve nos momentos felizes, que foram poucos, eram apenas parte da ilusão, medo da solidão, esquecer da solidão e procurar numa canção tudo que seu coração só soube dizer não. Mas enfim chegou a verdade, essa cruel realidade que no meio da saudade veio falar que felicidade não faz parte. Não adianta mais gritar, correr ou dançar, chorar ou sofrer, nesses olhos fechados eu posso ver, que quando o tempo chegar e você se afastar, não vai ter mais lugar para se abrigar, nem para quem ligar, conversar, chorar ou rir, só terá o que esquecer e a quem ignorar. Deixa o valor do dia que passou para o próximo dia. Se não sabia o que tinha, não vai ser agora que vai notar. Passam as ondas do mar e esquecem do céu que de tanto olhar, chorou pelo mundo inteiro. Ninguém te escuta cantando de frente ao espelho, querendo alguém para amar. Se um dia nessa vida, achar alguém que te defina e que no fim saiba qual valor te dar, vai esquecer que o sonho um dia existiu e nunca vai deixar de amar.

Pegadas de Vento

Pegadas de vento em areia queimada. Sabe-se lá por onde se passa. Fazendo sol ou caindo chuva, quero ver e mais nada. Sem trilhar caminhos, destinos ou redemoinhos, não sei o que faça. Se olho para o céu, vejo nuvens, me volto para o mar, água. Nos olhos não vejo nada. Então prossigo por entre incertezas e caminhadas. Nesse lugar chamado vida, só se segue com calma. Nem lembrança do rosto, nem carinhoso. Cada centrimetro de passado, medindo, meticuloso. Quero entender esse futuro duvidoso e esquecer do que quer ser esquecido. Não quero ver de novo, viver sem abrigo. Se acendo uma fogueira é para clarear. Esse coração que incendeia, nem lágrima apaga. Sentimento escondido dentro de cada favorecido, tendo a incerteza dessa vida transviada. Pois que venha onda e leve cada passo atrasado. Se souber por onde vou, não esqueço o que aconteceu, só não quero saber de viver no passado.

Subindo Ao Palco

De nada vale palavra dita em suspiro. Coração que bate forte é o mesmo que se cansa de bater. Não adianta a dúvida sem a possibilidade de uma solução. Então sentamos e assistimos o espetáculo. Rimos e nos emocionamos, sentados na ponta da cadeira, com medo do que pode acontecer. A cada som, algo diferente. Em cada movimento contorcido uma nova figura. A música se eleva e as palmas explodem. Somos então velhos jovens. Encontrando alegria na mais pura fantasia. Até que a cortina se fecha. O som cala e as luzes se apagam. Fica então a saudade da esperança na beleza que balança numa corda lá no alto. Deixa de lado a lembrança e fica só o desejo de querer estar no meio, mas com medo de estar. Artista sem picadeiro, vagando o vazio sem aplausos, maquiagem ou equilíbrio. Sem sorriso ou lágrima, amor ou rancor. Nada para mostrar a não ser o espaço em branco iluminado por uma luz branca. De nada vale o suspiro se a palavra não é dita. De nada vale dize-la se só suspiro for.

Te Deixo Dormir

Em silêncio, toco seu rosto com o lado carinhoso de minha mão - dorme coração - quero assim te ver descansar desse turbilhão de momentos indecisos. Quero que adormeça nos dias de sol e só acorde nas noites de lua cheia. Quando a loucura permeia e você pode ser livre, insano. Lembrar talvez um dia de quanto amo, mas agora você precisa adormecer. Acamar esses pensamentos soltos de tempos passados. Lembrar do que existe entre você e eu, esquecendo de quaisquer outros. Adormece então no meu peito, esse teu desejo de saltar ao ver aquele rosto ou ouvir aquele som. Fecha os olhos lentamente da saudade que te aperta. Deixa tudo adormecido, o romantismo, o carinho e espera a lua voltar. Enquanto não chega, de leve vou pisar, que é para não te acordar.

Only Angels Have Wings

Tudo faz sentindo melhor em preto e branco. As palavras ditas rápido e a cada sentimento diferente, algo novo aparece, como antes já esteve. Tudo é mais leve e ao mesmo tempo todos carregam um peso de uma vida inteira num segundo. Nada é simples e feliz, nada se enrola durante uma hora e por um tempo, tudo parece real e natural, como se a vida no geral fosse assim. Nada é feito de sonhos e o real é seco e feliz. A vida é um risco tomado a cada dia que passa e em todo corte da câmera. Não a nada mais do que um dia acordado e outro dormindo.

Lágrima em Sorriso

De nada sabemos desse nosso destino torto. Temos os sonhos, as vontades e os desejos, mas nada de concreto nesse futuro cheio de galhos esperando outro dia de estação para florecer. E eu aqui, quero agora tudo que queria ter. Fico com raiva, sem saber o que faça para esquecer. Já gritei da janela e dei murro em parede. Insônia e noites mal dormidas relembrando as partidas dos galhos fracos que o inverno quebrou. Lembranças do fruto mucho que o verão secou. Entre os dois extremos essa vida me deixou. Espero o vento frio ou o sol escaldante? Olho distante para uma história de amor. Onde o céu amava o mar e no meio, horizonte ficou. Vejo a chuva chegar e penso nisso. Quando um toca o outro, como o carinho de uma gota de lágrima em sorriso incontrolável. Quando a noite chega e os dois se tornam um. Não sei de destino, mas do impossível e que nada existe com tal nome. Então não me acanho e aguardo minha chuva, minha noite e seu sorriso lacrimejante.

Outro Eu...

Cansado de esperar essa vinda inesperada, melhor se atirar na indiscreta incerteza e aguardar a chegada do sonho. Esse não sou eu. Não fiz caso do sentimento nem o deixei coado. O bom e o ruim devem andar lado a lado, equilibrados. Não fiz nada disso. Em momento algum duvidei da fragilidade da mulher acanhada e sua determinação na procura por entendimento, tanto dela quanto meu. Nesse momento, não era eu. Principalmente, não deixei desistir, nem comandei sua vida ou joguei com a minha. Quis ser mais do que era e hoje, sou. Queria que fosse mais do que é e hoje, talvez um dia. Mas não me vem ao caso tal obrigação. Não sou eu na mão. Nem beijo apertado e muito menos uma palavra romântica. Cheguei a ser pergunta e nunca resposta. Mas cansei de querer entender e até de saber mais do que queria. Segurar a dúvida vazia. Cansei desse eu. Foi outro eu.

Saliva

Em cada encontro rodeado pela madrugada chuvosa dessa cidade, um beijo diferente me aguarda salivando desejo na minha solidão. Quero ser somente um, mas cada noite solitária me empurra para novos e desatentos braços, pernas e lábios. Nada sei desse próximo metro caminhado, apesar do que, acredito estar próximo do caminho, mas longe do destino. Mesmo com as dúvidas inerentes a qualquer ser pensante, respingo tinta vermelha na tela branca. O tempo agora é do desejo e loucura. Se olhar para trás em arrependimento, viro sal. Prefiro queimar nas chamas da luxúria do que acovardar-me diante do novo. Para encontrar o beijo certo, preciso beijar de novo. Não mais sozinho, mas completo. Não por outra pessoa, mas por mim. E cada vez que me afasto e olho nos olhos delas, penso na felicidade.

Essa Vida Vivida

Nem sabe o que vem ou quando volta. Tudo acaba um dia e já no fim, sem saber por que, perde toda a incerteza da certeza do que devia ser. Pode viver sem destino, mas um dia o destino te bota no lugar, mesmo que não queira. Nessas viagens de palavras, o certo é correr para longe e olhar a fumaça subir do que ficar perto do fogo e se queimar. Saber o que me espera, do lado em que estou, nem sei se quero ou se vou, mas sei que em algum lugar, depois de respirar fundo, vou parar num canto sem rumo, que foi para lá que acabei por rumar.

Quero-te ler uma história que começou numa noite:

Enquanto a fumaça paira pelas luzes aparecendo e desaparecendo a cada segundo iluminado e outro soturno, aguardo o momento preciso e a trajetória determinada pela visão aguçada de um jogo de bilhar, me surge uma idéia que até então não havia ocorrido pelo acaso de fatos e momentos tidos como importantes e logo em seguida, inócuos até que por momentânea sinapse, se desenvolveram em algo de grande importância. Completamente sem qualquer motivo aparente além do desejar da presença, procuro qualquer meio de contato na busca de sua companhia. Atordoado com o possível fato de não poder locomover-se ao recinto, me prontifico inteiramente a sua disposição. Observo logo em seguida a lua e a vejo cheia de esperanças assim como meu sorriso sem razão e caminhar saltitante.

Caminho até o veículo estacionado e observo o caminhar lento e possessivo de um gato pardo encima de uma estrutura. Por meros segundo, possuo a confiança de tal felino quando me esgueiro pelas ruas e sigo meu caminho. Desapercebidas, pessoas caminham pelas calçadas sem a menor idéia que dentro daquele automóvel, naquele exato segundo, existe alguém feliz. O ritmo do som e o bater do pé no assoalho do carro procuram ao mesmo tempo distrair tão nervoso motorista.

Desde o momento em que o movimento contínuo de rodas me levava de encontro a tal porta até o instante seguinte no qual me encontro a frente da mesma, não poderia imaginar tamanho aumento na pressão sanguínea que percorre meu miocárdio. Numa respiração, aperto por menos de segundo a campainha e me afasto. Os passos, primeiro em assoalho e logo em seguida silenciosos, aproximavam-se a minha frente, obedecendo o chamado melódico. Novamente os passos surgem, agora parados e acompanhados de uma sombra, vista pela fresta baixa da porta. A fechadura aparenta demorar séculos para ser aberta. O trinco se retorce e acompanha um rangido e uma voz: - Oi!

Uma Gota D'alma

Nesse canto vazio, aprendo quem sou. Palavras soltas, rodeadas de princípios sem meio ou fim. Vida comentada e dissecada entre linhas imaginadas e dedos agitados pelas emoções diárias. Se não fossem algumas mágoas, tudo seria descrito como alegres passagens da vida, mas como existem, quem sou eu para negá-las. Devo me esconder num imaginário estático de alegria falsa? Cada lágrima tem sentido em ser derramada. Sai direto da alma, pois o que vê não nega e o que sente, transborda. E toda solidão tem seu destino. Se nunca estivesse sozinho, não saberia o que é amor, sua cor e valor, essa prosa indescrita, indiscreta e desmedida, mas principalmente e com toda a força das palavras, sagrada e milagrosa.

No Caminho, Um Beijo e Uma Vida

No caminho, sozinho, senti um espinho. Retirei lentamente apesar da dor e continuei. Mais adiante, encontrei uma flor. Senti o seu perfume sedutor e segui. Pouco tempo depois, encontrei um lago. Banhei-me, bebi de sua água clara e fui adiante. Vi então moça bonita caminhando com uma cesta de frutas. Ofereceu-me uma maçã e um beijo. Provei dos dois e segui meu rumo. Pouco depois encontro um velho, de bengala na mão e uma carroça quebrada. Ofereço ajuda e ele não fala nada, conserto a carroça e nada me diz. Estendo a mão e nem um gesto. Sigo então minha trilha por ser melhor assim. Quando estou seguindo o caminho, o velho me puxa e diz:

- Essa carroça é sua meu jovem, pegue e volte por onde veio ligeiro. Alcance a moça com frutas e beijos ela é sua também. Construa uma casa ao lado do lago de banho e plante as sementes, colha a flor de perfume sedutor e entregue a ela como quem pede perdão e não deixe que nela entre espinho no pé, ela não merece dor.

- Por que diz isso o senhor?

- Fiz esse caminho. Já deixei cair espinho, plantei uma flor, vi chuva encher lagoa e mulher bonita por mim já passou, não quis seguir em frente e nem posso mais voltar e tudo que você vê um dia pode mudar. Faça uma vida jovem porque um dia a carroça quebra e esperando você vai ficar.

Criando Sinfonia

Faltam-me pedaços de uma todo incerto. Nessa completude variante de momentos arredios, me falta o prazer de ser e o verdadeiro ter. Nesta minha incapacidade acertada com as mutações dos dias passantes, sou encontrado delirante pelas ruas da cidade, chamando nomes e gritando apelos. Essa saudade que sempre me encontra, na falta que faz estar em lugar qualquer como dois e voltar ao mesmo como um. A mesa continua lá, mas brindo as sombras das horas. Esses pedaços amargos de lembrança, o seu cheiro, riso. Antes fosse tudo do que apenas um passeio nessa maré. Das lembranças, só palavras, nas histórias, uma frase ou duas, perdidas fazendo rodas nas gotas de chuva. Pergutas carregadas de "quando" e "quem" procuram em olhares diversos uma incerta melodia. Sinfonia sem condução, em altos e baixos carregados de tambores e violinos, desordenados e desconcentrados. Mantendo a calma e sem desespero, chega ainda, carregado em braços e abraços, a ordenação mais simples, descoberta por um beijo carregado de mil mais.

Só Você Pode

É alegria que você me passa, não fantasia. É lembrança de vida e não o fim. São momentos felizes, nada de tristeza. Os momentos feitos e não o passado. Seu sorriso acanhado e as brincadeiras. Quero estar próximo dessa beleza. Dessa vida completa, mesmo cheia de lacunas. Ver o futuro pelos seus olhos. Esperar que um dia seja verdadeira. Olhe a sua volta e volte a grandeza. Nos momentos felizes e mesmo na tristeza. Volta e seja quem um dia brilhou tão alto. Quero ver sua alteza dando meia volta. Ter a certeza, qualquer dia que seja. Que no dia certo, você não esqueça. Tem muita gente esperando que você volte. Sem flores, ou graças, mas como sempre foi. Sem egoismo ou cheia de razão, mas simples como ninguém. Espero que nesse fim, escolha o caminho certo. Não precise que o caminho seja escolhido por ninguém.

Volta a Incomodar

Entender é difícil e devo dizer quase impossível, mas tento. Essas ações contrariam, deixam confusas as intenções e apesar disso, procuro avaliar o comportamento e entender as reações. Na minha racionalização, noto ser incapaz de pensar linearmente quando emoções estão no meio. Não sei estar fora de controle. Preciso dominar a situação logo de início ou me entrego a ela. Nenhum dos lados é na verdade uma boa escolha. Ao dominar, a vontade se perde quando chega seu apogeu. Na entrega, se fragilizar de forma íntima, despejando inteiramente todas as vontades nas mais diversas intensidades. Essa entrega insana necessita de contenção. É quando começamos a nos amar. Talvez seja bobagem falar disso, mas é a verdade. Não que antes de encontrar alguém, precisamos nos amar. Para saber como amar, temos de aprender a colocar o nosso amor em primeiro lugar. Não ser egoísta, mas realista, por que no fim, se o caminho seguido não for o esperado, mesmo que se ame, a dor ainda domina, assim como o orgulho e a raiva. Amor próprio é o que faz amar, priorizar esse amor é o que nos faz mantê-lo.

Erro Meu

Movimentos incessantes dos meus atos. Não mais preso pelo passado, mas dono dele. O que aconteceu não se deixa esquecer, mas me ensina a mudar. Errei tantas vezes quantas tentei acertar. Não seria quem sou sem errar. Vejo em pedaços as fotos e recados, cartas e lembranças. Testemunhas do meu comportamento arredio, que não escondo. Não deixo mistério sobre o que sou. Um ser humano, um homem. Errando mais por saber que estou errado. Erro em dobro pelas conseqüências. Errei querendo errar. Nesse rumo, errei a rima, errei muro, errei saída. Não quero voltar mais, não quero corrigir. Não vale apena ser corrigido. Voltei a ser amigo dos meus erros, quando quero. Não conto histórias falsas de vida, tentando proteger-me das próprias iniqüidades por mim acometidas e escondidas dentro da consciência. Esquecidas estão às máscaras e os jogos que escondiam o passado que todos têm, jogando com emoções. Estou fora desse carnaval. Torcem-me o braço me forçando abraços. Pois quero ser eu mesmo. Definam-me por erros e acertos. Pois esse sou eu.

Meio Sorriso

A profusão das minhas palavras não se iguala ao sentido do seu meio sorriso. Perante tal silenciosa discussão envolvendo pequenos momentos e detalhes, acabo por abarcar o curioso e o sensitivo, questionando o imperativo num todo minimalista. Deixa-me tentando entender o gosto amargo dos olhares indecisos e impetrantes, direcionados as minhas palavras. Entre grosserias e choros latentes, nada me faz entender essa mente que me pragueja e no mesmo momento, anseia. O rubro do seu rosto me atrai a pele, faz querer perfurar cada instante do seu corpo com a vontade de te possuir. Juntar-te a escravidão dessa desejosa excitação. Olhar nos seus olhos lacrimejados e fazê-los sorrir. Preencher cada vazio deixado pelo caminho. No seu rosto, ver florescer um riso, mesmo que tímido e sem jeito. Tendo isso feito, posso enfim acordar.

(Revisado)

Quem é Ela?

Não tem nome nem cor. Olhos e cabelos de arco-íris e seu rosto nunca é o mesmo. Às vezes começa com "A" e termina com "Z", outros dias, nem começa. Ela é sentimento puro, de sentir pele e cheiro. Um sonho distante em cama estranha. É um desejo. Cada batida no meu peito. A saudade que rasga todo protocolo e se entrega a falta. Uma esperança em forma de sorriso ou lágrima. Quem quer que eu queira, ela é. Noite do dia, maré, chuva e sol. Ofusca ou apaga. Pode ser anjo, ou razão da perdição. Livre, mas cativa do meu coração. Pode ser real ou ilusão. Ser vontade ou certeza. Ela não é nada do que parece ser, mas tudo em um só lugar. Cheia de carinho, me abraça feito mãe. Toda fogosa, me beija rasgando a boca. Ela é toda em tudo do todo de tudo. Ela é minha tinta, minha tela, meu vocábulo, minha gramática, minha excitação. No seu silêncio, no seu vazio, na minha alma ela é inspiração.

Estranhos Íntimos

Nada de orgulho. O tempo passou e simplesmente nada mais existe. Algumas palavras distantes de momentos passados e retratados nas trocas de olhares de um lado para o outro daquele qualquer lugar. Lembranças disfarçadas de pequenos intervalos, sorrisos ou gestos. Essa certeza da distância muda um para o outro. Gostávamos sim, mas não somos os mesmos. Não somos mais a resposta, somos o atraso: “Deixa isso de lado e esquece. Já esta na hora”. As feridas que causamos, cauterizam. As mentiras que contamos são esquecidas. Somos duas pessoas, de dois lados opostos, olhando lembranças de longe e sendo educados. Estátuas da felicidade, que apenas nos levam a dias anteriores. Impossível esquecer a intimidade sem arrancar com crueldade um pedaço de si. Apesar disso é possível não falar, nem tocar ou brincar. Somos estranhos íntimos, sem saber o que dizer.

Algo a Dizer

Pulando nas poças de água, espalhadas pelas ruas dessa cidade cinza de três horas da tarde. Sempre com algo para dizer e sem motivos para falar. Saltos pequenos, outros gigantescos, espalhando para todos os lados algumas dessas idéias, tentadas a serem vocalizadas. Mas cada um sabe a poça em que pula, algumas são pequenas e brincalhonas, outras nos afundam e ficamos presos e conformados. Vou então saltando seguro, dançante e sem me importar com as calças molhadas até o joelho, tive vontade, sem me importar. Penso como essa tela branca, esperando um momento oportuno para se encher de vida e sabor. Para que guarda-chuva, se nesse lugar, morro de calor? Não sou obrigado ao conformismo, mesmo que este não venha da maioria. Sou o que vem de mim. Sou tinta.

Nublado

Todos esses sentimentos nublados. Quando a manhã não é dia nem tarde e simplesmente nubla. Linda essa palavra. Apesar de sua conotação negativa, possui beleza díspar de um dia do passado; ontem o que era sol, hoje esta nublado. Pequenos momentos de luz atravessando as nuvens, acendendo a chuva, anubliando a razão. Sinto-me descansado, sentindo de leve o vento e esquecendo o tempo, num daqueles momentos raros de se olhar para o nada no teto do quarto. Esse dia sem dia me deixa em pedaços, fantasias e vontades. Inclino minha cabeça pela janela, com o rosto virado para o céu, acariciado. Volto aos poucos para o momento real, hesitando deixar para trás os segundos, mas passou.

Maré Alta


Sonhei com maré alta, atravessando ruas e avenidas. Chegava até meus pés, tocava-os levemente e simplesmente voltava, sem aviso ou cerimônia. Se foi sem perguntas ou respostas, lembranças ou declarações imensas de um amor profundo. Ao redor, todos banhados da água do mar, se perguntavam como até ali foi chegar. Falei que foi saudade, mas ninguém ouviu, disse que era carinho e fui ignorado. Então segui por caminho molhado e cheguei até o mar, cercado por areia branca, com o sol a banhar. Fui até a beirada te beijar, ver sorrir essa falta que não me largava. Mas como maré alta, começou a se afastar, mais uma vez fico de longe a te enxergar, se movendo pela lua e o vento. Observando horizonte, sento e escrevo, sobre o sonho da maré alta e a saudade que me causa.

Lembranças Mudas


São palavras não ditas. Aqueles detalhes parados no ar antes de qualquer impulso. Silenciadas pelo momento indefinido. Deveriam ser as palavras de mais fácil esquecimento, mas levitam na mente como lembranças mudas. Ouvido não sabe, mas coração aperta e procura no vazio a propagação do sentimento escondido. Detalhes, dentre tantos, revirados e transformados em pequenas cores, tentam explicar o que significam sorrisos e lágrimas. Hesitações e nervosismos, dúvidas e questionamentos. Todas ditas em silêncio, com medo de se entregar. Jogados em linhas retas, estornadas pela vontade de explodir em cada pensamento não formulado. Mesmo em meio a palavras ásperas, cercadas de angústia e raiva, tentam falar de amor e esperança. E no fim da dança, com a música silenciando os passos e corações, se ouve o que não é dito e se sente o que não se pode falar. Não existem palavras, mas detalhes entregues ao momento.

O Dia Mais Claro

O dia clareia se debatendo entre os corredores do apartamento. Vizinho bem vindo depois do alento matutino. Hoje não tem tristeza, entre o coração e a certeza, dou preferência ao dia que acorda vibrando com a manhã. E mesmo um dia claro precisa da noite escura. Onde sonho existe e persiste, esperando o amanhecer, em busca da realização. Sou novo dia, acordando companhia, respirando maresia, vivendo de baixo para cima, para o alto do caminho, além do nublado, de encontro com os raios de sol. Abro as asas flamejantes num ganir incessante, recheado de provações. Sobrevivi às inflamações que me cercavam para novamente observar com novos olhos esses dias mais claros que estão por vir.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Blogger Templates by Blog Forum

http://meublogtemconteudo.blogspot.com/